Administração auxiliar de condomínios ou contabilidade de condomínios?
A criação da Comissão de Contabilidade Condominial do CRCRJ gerou grande interesse por parte dos profissionais que acompanham o conselho nas redes. Como você descreve as oportunidades desse segmento para os contadores?
Vemos com grande satisfação o interesse da classe contábil na atividade condominial. É uma área em que diversos profissionais das ciências contábeis já atuam. Um dos objetivos da comissão é fortalecer o papel do contador nas administradoras de condomínios. Outro propósito é trazer a contribuição das técnicas contábeis aos condomínios, propiciando um adequado controle patrimonial. A comissão de contabilidade entende, com base nas competências profissionais definidas em lei, que os setores de departamento pessoal e obrigações acessórias das administradoras de condomínios devem ter contabilistas responsáveis.
O trabalho realizado nas administradoras de condomínios é, em grande parte, de natureza contábil. Podemos dizer, sem contradita, que o trabalho é mais contábil que administrativo. Embora carregue o nome de administração de condomínios, na realidade é um serviço de natureza auxiliar, pois não participa da gestão direta do condomínio. Os serviços administrativos prestados são auxiliares à gestão direta do síndico, ou seja, não há uma administração na acepção plena da palavra, com as funções gerencias bem caracterizadas. Nesse particular, nos moldes em que são prestados atualmente, os serviços prestados pelas administradoras são rotinas de suporte ao trabalho do síndico, em que não identificamos as funções gerenciais de planejamento, organização, direção e controle em sua acepção plena.
De outro giro, muitos dos serviços prestados pelos escritórios denominados administradoras são, em sua essência, de natureza contábil. Dentre esses serviços podemos citar a classificação e lançamento de despesas; elaboração de plano de contas; previsão orçamentária para o exercício fiscal com provisões e fundos diversos; elaboração de declarações fiscais acessórias (RAIS, DIRF, CAGED); apuração e retenção de impostos; elaboração de balancetes de prestação de contas; rotinas trabalhistas de admissão, manutenção e dispensa de empregados; obtenção de certidões fiscais periódicas que evidenciem a situação do condomínio (certidão conjunta da receita Federal do Brasil, certidão da Justiça Federal, certidão de devedores trabalhistas, certidão de regularidade do FGTS e consulta à situação fiscal e tributária do condomínio junto ao E-cac), além de outros.
A comissão de contabilidade condominial do CRC entende que as administradoras auxiliares de condomínio deverão contar com contadores em seus quadros de colaboradores, de forma a contribuir para o aprimoramento do plano de contas do condomínio, classificação e lançamento de despesas. A contabilidade irá orientar os funcionários da administradora quanto aos documentos adequados para elaboração dos balancetes mensais e quanto aos aspectos tributários. Os contadores contribuirão para criar relatórios fiscais periódicos, com todas as certidões da entidade, evidenciando a regularidade das declarações fiscais, recolhimento de tributos e contribuições.
Há para os contadores um excelente mercado na auditoria externa preventiva periódica nos balancetes mensais de condomínios, prestando orientação e esclarecimento aos conselheiros fiscais e sociedade condominial. Existe um grande segmento na auditoria anual para revisionamento de contas nos condomínios, conferindo transparência, segurança e confiabilidade nas informações prestadas.
O presidente da nossa comissão de contabilidade em condomínios, Rafael Machado, é também o presidente da comissão de BPO financeiro do CRC, tendo alertado sobre a relevância deste tema para os contadores, já utilizado em algumas administradoras de condomínios. Este de fato é um tema mais afeito à administração de condomínios do que ao setor de contabilidade, embora pessoalmente entenda que seja uma competência profissional comum entre os contadores e administradores nas organizações condominiais. O BPO financeiro, em síntese, é o gerenciamento e controle das contas a pagar, contas a receber, conciliação bancária, fluxo de caixa, emissão de notas fiscais e de boletos, por exemplo. É a terceirização da atividade financeira, aplicável aos condomínios especiais em edificações, permitindo que os síndicos foquem em outros assuntos condominiais.
De que maneira você enxerga os impactos da pandemia para a contabilidade condominial?
A pandemia traz algumas grandes lições para mundo corporativo. A primeira delas é a cooperação, o operar em conjunto, o trabalho em parceria. A cooperação é o único caminho para a sociedade progredir, propiciando intercâmbio de informações, esforços, trabalho e mútua assistência entre profissionais, empresas e instituições. A mentalidade da cooperação decreta a mudança de paradigma, aplicando um severo golpe na mentalidade de competição predatória em todas as áreas profissionais. O papel do bom profissional é o de contribuir para o progresso das instituições.
A segunda grande lição é o redimensionamento de espaços, pois o mundo físico vem sendo reconfigurado diante do mundo digital. Nesse desiderato, os locais físicos de trabalho, os documentos materiais, o deslocamento entre as instituições em razão do trabalho e a distância estão sendo completamente ressignificados em razão do uso intensivo da tecnologia.
A terceira grande lição é a completa transformação de pessoas, produtos e processos diante da tecnologia. A pandemia precipitou mudanças que relutavam em ocorrer. Impulsionou outras transformações que já estavam em curso, mas que vinham sendo processadas de forma lenta. Em síntese, a pandemia trouxe a tecnologia como ferramenta necessária à sobrevivência das pessoas, empresas e instituições. Impôs mudanças disruptivas em toda a sociedade, fazendo com que o mundo das relações de trabalho e negócios passe por uma completa reconfiguração.
Com efeito, a pandemia permitiu a aceleração e o avanço significativo do processo tecnológico na prestação de serviços contábeis. A tecnologia é requisito indispensável para a sobrevivência dos escritórios de contabilidade.
Qual a sua indicação de conteúdos e iniciativas para profissionais da contabilidade que pretendem começar a atuar nesse segmento?
Não seria exagero dizer que quase toda a literatura existente aborda o condomínio especial em edificações apenas sob a ótica jurídica. De fato, é um importante ponto de partida, pois o contador precisará entender os fundamentos do condomínio edilício. Ao estudá-los, deverá compreender o condomínio em edificações como a copropriedade sobre as partes comuns, em coexistência com a propriedade exclusiva de áreas privativas de cada coproprietário. O ordenamento jurídico traz a estruturação do condomínio com sua instituição e constituição. Em resumo, fundamenta sua administração, seus órgãos de gestão, os direitos e deveres de cada condômino; as atribuições do síndico, seus deveres e as causas para destituição; a realização das assembleias ordinárias e extraordinárias, suas competências e o modo de realização; e a extinção do condomínio.
Trata-se de leitura necessária para o contador compreender o condomínio especial em edificações no alicerce do direito de propriedade, constituindo-se um patrimônio comum dos coproprietários. Esse patrimônio comum não é dotado de personalidade jurídica, sendo um ente despersonalizado, mas é capaz de adquirir direitos e obrigações para atender as necessidades dos condôminos. No entanto, nas áreas da administração e contabilidade são raros ou mesmo inexistentes os textos neste sentido. A comissão de contabilidade em condomínios pretende desenvolver, com apoio do CRC, material próprio sobre a ciência da contabilidade aplicada aos condomínios especiais em edificações.
Por fim, convidamos à leitura dos artigos seguintes, que discorrem sobre a contabilidade em condomínios e a necessidade de desenvolver uma administração específica aplicável à realidade condominial:
EGITO, F. Um primeiro olhar sobre a contabilidade em condomínios. Disponível em https://cursoaprimora.com.br/artigos/um-primeiro-olhar-sobre-a-contabilidade-em-condomnios, acesso em jun/20.
EGITO. F. A necessidade de uma administração específica aplicável aos condomínios. Disponível em https://www.jb.com.br/pais/justica/2020/02/1022016-artigo--a-necessidade-de-uma-administracao-especifica-aplicavel-aos-condominios.html, acesso jun/20.